21.3.07

Maldita tampa

Ela não conseguia. Tentava, em vão, abrir aquela maldita garrafa de água.


"Porque fazem estes lacres? Porque simplesmente não usar um botão para abrir a água?"

Recusou-se a parar o carro e pedir ajudar.

"Maldita seja a garrafa de água, e malditos sejam os homens que inventaram a porcaria deste lacre".

Sim, claro que foi um homem que inventou tal objeto. Porque pensar em unhas compridas e recém-pintadas? Pra que lembrar que nem todos nós nascemos com a força de Hércules?
(tá bom, pode ser exagero, mas convenhamos que nessas horas de desespero, qualquer pessoa pode se dar ao luxo de ser exagerada)

Tentou usar a boca para puxar os 3 nanocentímetros de plástico que os fabricantes (homens!!!) deixam para que seja possível torcer e puxar a tampa. Nada. Nem se mexeu.

Por que, afinal, é que ela queria'água? Podia muito bem deixar pra beber quando chegasse em casa. Onde já se viu? Comprar água na rua? Coisa de quem tinha dinheiro e nada para gastar. Ela não era assim...

Droga, não adiantou. A tentativa frustrada de se enganar, de tentar achar que não estava com sede fracassou miseravelmente; assim como as outras inúmeras tentativas de abrir a garrafa de água.

Como pode? Ela trabalha, estuda, lê, sai de casa, paga contas, sobe escadas, corre no meio da rua para não perder aquela matéria exclusiva e, mesmo assim, consegue ser derrotada por alguns centímetros de plástico reforçado. Só dava para acreditar vendo.

"Moço, por favor, o senhor pode abrir aqui esta garrafa pra mim?"
"Não, não tem nada de errado com a tampa"
"Sei, sei.. claro que eu consigo abrir sozinha, é que estou com o dedo fraturado. Acabei de cair no chão, bem encima dele"
"Ah, obrigada. É, já estou indo cuidar dele agora mesmo. Colocar gelo, hipoglos, tudo que precisa"
"Não, claro que eu sei. Estava só brincando. Vou só colocar gelo mesmo"
"Tropecei em que? Bom, na minha auto-estima. Só assim cosegui criar coragem para parar o carro aqui neste posto e pedir para o senhor abrir a porcaria desta tampa"
"Pro senhor também... e obrigada novamente"

Foi, bebendo a água e pensando se, quando crescesce, poderia inventar uma tampinha especial... Daquelas que saem só com o pensamento ou, no máximo, um clique...